A data de hoje vem sendo "comemorada" em muitas instituições como o momento em que os militares deram um golpe e tomaram o poder, implantando a ditadura militar no Brasil.
Na Universidade Federal do Pará foi a data de posse da "Comissão da Verdade", além de palestras alusivas ao período de exceção. Em muitas escolas públicas e privadas os educadores, entre os quais os historiadores, fizeram atos solenes e reflexões acerca dessa temática. Numa dessas escolas foi emblemática a representação, ou encenação, em memória aos guerrilheiros mortos e desaparecidos. Na ocasião foram acendidas velas quando o nome de cada um deles era nominado.
Duas questões se colocam: a primeira, não seria a escola um espaço laico? Penso que sim e, ainda, que as manifestações religiosas devessem se dar tão somente para os que fossem praticantes de determinado culto religioso, pois tal abordagem agride aos praticantes de um culto religioso e os não praticantes por tomarem parte de um evento que não é do hábito religioso de boa parte dos alunos. A segunda questão, acaso todos os mortos e desaparecidos durante a Ditadura Militar, principalmente boa parte praticante do materialismo histórico e dialético concordariam em ser homenageados com determinadas práticas religiosas que, possivelmente, abominariam? Inclusive não muito tempo atrás acreditar nas profecias de Karl Marx era também acreditar que a Igreja (ou melhor, as igrejas) era o "ópio do povo". E, por isso mesmo, celebrar a memória desse ato como um ato religioso não seria mexer, incomodar, provocar os mortos e desaparecidos com algo pelo qual eles lutaram, combateram.
É senhoras e senhores, às vezes, não sabemos o que queremos e não sabemos como queremos. Isso é emblemático nesse caso em particular.
Talvez o processo dessa homenagem merecesse uma pesquisa, uma investigação e para cada um dos mortos e desaparecidos, devêssemos celebrar conforme o credo religioso de cada um: para católicos, missa; para protestantes, culto; para os adeptos das religiões afro-brasileiras, um despacho ou batuque; e assim sucessivamente. Para os ateus, nenhuma menção a qualquer credo religioso. Assim, talvez a coisa funcionasse melhor.
Quanto à Comissão da Verdade ou às "comissões da verdade", obviamente que é justa a implantação e meritória buscar o que "de fato" aconteceu naqueles momentos cruéis em que muitos manifestantes, estudantes, operários, políticos, guerrilheiros foram presos, torturados e desapareciam sem deixar vestígios. Isso, com certeza, deve ser trazido à tona e investigado, muito embora a questão da reparação de danos com o advento da ANISTIA não seja tão fácil, ou até impossível. Contudo, a questão da denominação desse grupo de investigadores traz certos incômodos, pois a Comissão da Verdade é muito pontual em suas tarefas e o foco é muito restrito, talvez reflexo da própria restrição de olhar de quem a elaborou.
No Brasil, tivemos momentos cruciais de violência e ditatura. No Pará, a coisa não foi diferente. E, somente para citar alguns exemplos tivemos o episódio do "brigue Palhaço", os escravos mortos e desaparecidos, índios mortos e torturados durante todo o processo de colonização, a sanguia da Cabanagem, a violência dos Corpos de Trabalhadores, a opressão sobre os seringueiros com a escravidão da economia do "barracão", as lutas violentas e agressões quando das oligarquias que governaram o Estado na primeira república, os choques pró e contra o movimento tenentista, a instalação no Pará do novo coronelismo à la Magalhães Barata, a implantação do Estado-Novo que calou a oposição no Estado, a violência dos "Grandes Projetos" e suas mazelas: desabrigados por barragens, garimpeiros acometidos com mercúrio, etc.
É nobres amigos, ainda há muito o que descobrir de verdade. Muitas das quais envolveriam investigações acerca do custo, gasto, obtenção, utilização, destinação de recursos públicos. Como ficou o caso do Cuiaranas Esporte Clube? Não o sabemos!!! Como ficará o caso da ponte do Mojú? Esperamos que seja bem apurado. Como está a investigação sobre o BRT? Em andamento? E as conclusões?
Como se vê, muitas vezes o foco é retirado para questões pontuais e não se investiga como deveria questões mais amplas e sérias, em nível nacional. Como vai ficar os mensaleiros, entre os quais figura um ex-guerrilheiro.
Interessante é que a memória da guerrilha e da luta contra a ditadura deveriam ter forjado um caráter mais resistente às negociatas e transações escusas, mas não é o que se viu no processo que o Ministro Joaquim Barbosa fez comentários eloquentes. Parece que nessa questão de método o que mais a esquerda soube criticar esteve (ou ainda está?) entre suas práticas. A tortura, a morte sumária, o desaparecimento de rivais e inimigos políticos foram praticados na China, na extinta URSS, em Cuba e em muitas outras parte em que o "socialismo real" e se tentou implantar a "ditadura do proletariado" - engraçado é que em nenhum desses países o proletariado chegou ao poder! E o termo ditadura parece que não era tão abominável assim. Ah! Para a esquerda podia e para a direita não! Talvez a lógica fosse essa (e ainda seja).
Por incrível que pareça não vi os "bleques bloques" protestarem contra ou a favor disso ou daquilo acerca de 1964. Talvez tenham caído na real ou estejam preparando os enfeites para torcer pelo Brasil na "Copa de 2014", como bons brasileiros que são.
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